sexta-feira, 21 de maio de 2021

 Inexperiências Profissionais: O caso do "peru num pires".

Texto publicado na Revista Mais/AP numero 143 pag. 7

Depois da graduação (1965) esperava-se que eu conseguisse um emprego. Depois de alguns desencontros e experiências frustrantes, fui contratado para trabalhar no então Departamento de Parques e Jardins da Prefeitura de São Paulo. Junto comigo foram contratados cerca de 10 jovens arquitetos, quase todos recém formados. Tínhamos a função de aplicar os resultados do Plano Diretor de Áreas Verdes de São Paulo, plano que estava em desenvolvimento pela equipe montada pelas Arqtªs Paisagista Rosa Grena Kliass, e Miranda Magnoli, além de outros profissionais, na gestão do Prefeito Faria Lima
Éramos todos muito jovens numa perspectiva de trabalho relevante para a cidade. Entusiasmo não faltava. Nosso primeiro projeto foi reformar um espaço para que nos instalássemos. Adequamos um espaço ocioso existente junto ao Viveiro Manequinho Lopes, dentro do Parque Ibirapuera. Grandes portas voltadas para um belo jardim caracterizavam o ambiente.
Tínhamos tudo, um belo espaço de trabalho, um grupo de profissionais envolvidos com as possibilidades que se apresentavam. Entretanto, a maioria de nós tinha somente os conhecimentos obtidos no curso de arquitetura e urbanismo, sem qualquer experiência profissional na área. Afortunadamente, na sala ao lado a equipe de Rosa e Miranda desenvolvia alguns projetos modelo o que nos mostrou caminhos a serem seguidos.
Depois de algum tempo de trabalhado, fazendo nossos próprios projetos, nos sentíamos experts no assunto.
Na época a Praça Roosevelt estava deixando de ser um espaço abandonado, asfaltado, servindo para estacionamento para se transformar em uma grande praça cobrindo as novas estruturas viárias em construção, responsáveis pela ligação leste/oeste. Deixava de ser um estacionamento se transformando numa praça em concreto e pouquíssima vegetação. O Arqtº Paisagista Roberto Coelho Cardoso, professor da FAUUSP, com a participação do Arqtº Marcos Souza Dias seu ex-aluno foram os responsáveis pelo projeto. Atualmente essa praça passou por uma reforma de autoria do Arqtº José Borelli procurando criar espaços mais atrativos aos moradores das imediações.
Evidentemente, uma obra de grande porte que modificava a cidade, deu muito o que falar. Como sempre os a favor e os contra.  
Nestas circunstâncias, uma jornalista foi nos entrevistar, arquitetos paisagistas da prefeitura.  Numa conversa descontraída, eu e uma colega, também recém-formada, falamos sobre diversos aspectos do projeto e num determinado momento, fizemos a bobagem de afirmar que o projeto parecia um “peru num pires”.
Ingenuidade de iniciantes na atividade profissional. Não sabíamos ainda que quando somos entrevistados por um jornalista precisamos tomar cuidado com que dizemos, não éramos mais estudantes. Usamos uma expressão inadequada do ponto de vista ético em relação a outros profissionais. Eu havia sido aluno de Cardoso e colega de Marcos Souza Dias.
Tudo poderia ter ficado entre nós não fosse a reportagem publicada no jornal cuja manchete era “arquitetos da prefeitura afirmam que a nova Praça Roosevelt é um peru num pires”. Além disso citava o meu nome e da colega.
Foi uma triste experiência, mas como qualquer outra nos permitiu que a partir daí, como profissionais, precisamos qualificar as críticas que possamos ter sobre projetos arquitetônicos e sobre interferências urbanas.  


 


Arquitetura - Peripécias do exercício profissional.

 Texto publicado na revista Mais/AP número 142

Ao longo da carreira o arquiteto coleciona histórias, algumas divertidas outras nem tanto. Deixando de lado as desagradáveis vamos comentar uma vivenciada por um colega.

No processo de projeto muitas vezes precisamos deixar claro ao cliente as responsabilidades que assumimos na elaboração de uma nova edificação ou mesmo de uma reforma. Muitas vezes, ao colocarmos esses aspectos corremos o risco de não sermos entendidos.

Um desses aspectos que é a segurança física de um edifício e a responsabilidade que nos cabe, podem trazer desencontros que podem até se tornarem divertidos.

Há alguns anos foi publicado um artigo numa revista, se não me engano elaborado pelo arquiteto carioca Claudio Cavalcanti, onde ele fala de uma experiência profissional que mostra a dificuldade de se fazer entender em relação à segurança física de um edifício.

Chamado para projetar a reforma de um apartamento, os proprietários colocaram suas intenções e necessidades. Entre elas seria a demolição de um pilar que ficava no meio da sala. Numa boa prática profissional ele esclareceu que não poderia eliminar o pilar em função da necessidade estrutural do edifício. Para tanto fez uma explanação teórica, falando sobre a construção de um imóvel com vários andares que implica em uma estrutura de concreto independente das alvenarias, informando que as paredes não davam sustentação e que a estabilidade dependia da estrutura com pilares e vigas. A ausência de um dos pilares poderia trazer graves consequências para o edifício, explicou.

Nenhum de seus argumentos foram esclarecedores e mais uma vez refez a explicação usando exemplos e demonstrando que a estrutura tinha uma racionalidade semelhante ao esqueleto humano. Não se pode eliminar uma perna ou um braço sem prejudicar as condições de saúde de uma pessoa e que a “saúde” do edifício dependia de todos os pilares e vigas.

Entretanto, por mais que explicasse, não conseguia se fazer entender. Num certo momento a proprietária afirma que de maneira nenhuma aceitaria a permanência do pilar. E ponto final!

Nessas alturas a situação ficou constrangedora, o arquiteto não poderia retirar o pilar em função dos argumentos anteriores e a proprietária não abria mão de sua proposta. Conversa vai e conversa vem, num certo momento ela abraçou o pilar e com ele saiu dançando, dizendo esse pilar foi meu marido que fez, um armário com rodinhas, imitando um pilar no centro da sala.

Pois é ..., as vezes ficamos sem palavras